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Justiça abre precedente para empresa devedora manter-se no Simples
Em um momento de crise, a sobrevivência das Micro Empresas (MEs) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) é essencial para a economia.
01/01/1970 00:00:00
Lígia Ligabue
Em um momento de crise, a sobrevivência das Micro Empresas (MEs) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) é essencial para a economia. Mas uma das exigências do Simples Nacional - sistema unificado de tributos - que é manter o pagamento dos impostos em dia, está colocando em risco a saúde financeira de muitos empreendimentos. Caso não consigam quitar as dívidas, essas empresas são excluídas do Simples e submetidas a uma carga tributária maior. Questionando essa exigência, um escritório de advocacia de Bauru conseguiu, na Justiça Federal, uma liminar para manter uma empresa no sistema diferenciado, mesmo inadimplente. Para o contador Paulo Martinello, a decisão é positiva e pode beneficiar outras empresas.
O advogado e professor universitário João Carlos Piccino, autor do pedido de liminar concedido pela Justiça Federal, destaca que a Constituição Federal estabelece que MEs e EPPs devem ter tratamento tributário diferenciado. E a lei que trata do Simples Nacional diferencia essas duas modalidades de acordo com o faturamento anual. Já a lei que regulamentou o Simples diz que só podem permanecer nesses sistema diferenciado as empresas que estiverem em dia com os impostos. Do contrário, são excluídas. “Mas pela Constituição, a única condição para definição de MEs ou EPPs é o rendimento. O pagamento ou não de tributos não é levado em consideração”, pondera.
“Quando o Simples traz essa exigência é uma coação de pagamento. A única forma legal de obrigação de pagamento é a execução fiscal”, analisa Piccino. “E a única pessoa que tem essa prerrogativa é o juiz. Ele é quem manda pagar ou pegar algum bem para quitar essa dívida”, explica.
Piccino avalia que tirar um empreendimento do Simples é obrigá-lo a enfrentar uma carga tributária ainda maior, o que agravaria sua saúde financeira. “Pelo menos 90% das empresas não devem porque querem, mas porque não têm condições de arcar com isso”, diz. “E obrigar uma microempresa que suporta pagar uma carga tributária diferenciada a ter que enfrentar os impostos cobrados normalmente é acabar com ela”, avalia. “Isso leva ao desemprego e à perpetuação da crise”, destaca.
Além do empreendimento que defendeu, Piccino avalia que outros milhares de negócios poderão se beneficiar da decisão da Justiça Federal, que ele acredita ser inédita. “Só na Receita Federal de Bauru cerca de 4,6 mil empresas que estão no Simples receberam notificação para quitar suas dívidas”, destaca o advogado.
A Justiça aguarda a manifestação da Receita Federal para então determinar a sentença. A União pode recorrer. Mas Piccino destaca os aspectos positivos da liminar que foi publicada no Diário Oficial na última quarta-feira. “É o Poder Judiciário colocando ordem na voracidade de arrecadar do Governo. Ninguém pode ser coagido a pagar”, diz. Ele também avalia que a decisão mantém o estado democrático de direito, já que apenas o Judiciário pode obrigar uma pessoa a quitar suas dívidas.
“Isso fora a questão social. Diversas outras empresas podem entrar (na Justiça) e conseguir se manter na formalidade, gerando riqueza e renda”, enfatiza.
Procurada pelo Jornal da Cidade, a Delegacia da Receita Federal de Bauru informou que não se manifesta sobre decisões judicias. Nos 45 municípios abrangidos pela regional, 33.224 empreendimentos estão inscritos no Simples.
Positivo
Para o contador Paulo Martinello, a liminar foi uma vitória. “É um ganho muito grande. As empresas não podem ficar nessa dependência. Se o negócio está em dificuldades, continuará sendo prejudicado. Cabe à Receita cobrar, mas não impedir os benefícios do Simples”, avalia.
Martinello destaca que a manutenção de empreendimentos é essencial nesse momento de turbulência financeira. “A crise mundial tem gerado dificuldades. O desemprego está aumentando. As empresas encontram dificuldade para pagamentos. Num momento difícil, o empresário primeiro salda os salários dos empregados e depois procura pagar os impostos”, afirma.
O contador explica que, ao perder o benefício do Simples, a empresa entra em um regime de tributação mais pesado. “Se estão com dificuldades no Simples, imagina tendo que pagar em outra alíquota, sobre lucro real e lucro presumido”, questiona.
Ele pondera que existe o parcelamento da dívida de tributos, mas reconhece que, mesmo assim, muitos encontram dificuldades para sanar os débitos. “Aí vêm os juros, as multas e tudo se acumula”, descreve. “E essa liminar é bem justa, abre essa brecha. E, felizmente, aconteceu em Bauru”, destaca.
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